Como está a covid-19 na população pediátrica? Qual é a importância da vacinação também nesta população?
Quando o assunto é covid, devemos ter em mente que as informações podem mudar a qualquer momento. Isso não deveria trazer insegurança e sim vigilância. Pois estamos enfrentando algo inusitado e caminhando junto com a ciência em tempo real.
Vou colocar aqui alguns pontos que sabemos até o momento para refletirmos juntos:
- Estudos realizados em diversos países estimam que o número de casos de COVID-19 na faixa etária pediátrica seja de 1% a 5% do total de casos confirmados. Em sua maioria as crianças e adolescentes apresentam formas mais leves ou assintomáticas da doença. Porém, não estão isentos da ocorrência de formas graves, como a Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) e a Síndrome Inflamatória Multissistêmica Pediátrica (SIM-P).
- No Brasil, entretanto, temos uma taxa de mortalidade (mortes por milhão) em crianças e adolescentes 15 vezes maior que em países como Estados Unidos e Reino Unido. Infelizmente influenciados por inúmeros fatores como desigualdades sociais, dificuldade de acesso a água e esgoto encanados e a hospitais e sistemas de saúde adequados.
- Os principais grupos de risco para a doença COVID-19 na população pediátrica são crianças com doença pulmonar crônica, obesidade, doenças neurológicas, doença cardiovascular crônica, imunossuprimidos e doenças metabólicas. Estes grupos têm maior risco para desfeches graves como internação e morte. As faixas etárias menores de dois anos e maiores de 12 anos apresentaram, em um estudo brasileiro, risco pelo menos duas vezes maior do que crianças entre 2-11 anos de idade.
- Tem-se evidências da persistência de sintomas após a fase aguda da doença em até 27% das crianças – a chamada COVID longa. Entre os sintomas mais comuns estão: fadiga, cefaléia, sonolência, perda de concentração e anosmia. Mesmo naqueles que tiveram sintomas leves.
- A Síndrome Inflamatória Multisisitêmica pediátrica (SIM-P) no Brasil, segundo o boletim epidemiológico da secretaria de vigilância em saúde do ministério da saúde de agosto de 2021, confirmou 1158 casos em crianças e adolescentes (0-19 anos), sendo que 69 evoluíram para óbito (taxa de letalidade 6,3% – comparados a 1,5% nos EUA). Em relação a SRAG, do total de casos, 1,5% ocorreram em crianças e adolescentes de 0-19 anos.
- Apesar de haver uma desproporção em número de casos de COVID-19 na população pediátrica, já ocorreram mais de 2 mil mortes por COVID desde do início da pandemia. Esse número é maior que a soma de todas as mortes por doenças imunopreveníveis na infância em nosso país. Isso mostra que a carga da doença não é negligenciável na população pediátrica.
- Com o desenvolvimento acelerada de vacinas na população adulta, e o sucesso na vacinação deste grupo, é natural que a população pediátrica também seja contemplada em estudos.
- No Brasil, até o momento, a única vacina licenciada pela Anvisa para uso em adolescentes maiores de 12 anos é a produzida pelo laboratório Pfizer com um regime de duas doses, com 21 dias de intervalo. Este estudo provou que a vacina é segura, imunogênica e resultou numa eficácia muito boa a partir de 7 dias após a segunda dose. Resultados semelhantes também foram verificados em adolescentes de 12-17 anos com a vacina Moderna.
- Em relação a vacina Coronavac, estudos de fase 1 e 2 mostram segurança e imunogenicidade da vacina em crianças e adolescentes de 3-17 anos. Porém a solicitação para o seu uso emergencial não foi aceita pela Anvisa considerando que os dados apresentados eram insuficientes para estabelecer o perfil de segurança, proteção e duração na população pediátrica. Esta mesma vacina, ja é aprovada em crianças e adolescentes maiores de 6a anos no Chile. O que indica que a sua aprovação será apenas uma questão de tempo.
- Em relação as crianças, não há ainda nenhuma vacina licenciada para uso no Brasil. Estudos de fase 3 ainda estão em andamento para garantir a segurança e eficácia nessa população.
- Após o licenciamento no EUA da vacina Pfizer para crianças e adolescentes a partir de 12 anos e da vacina Moderna para adolescentes acima de 18 anos, desde maio de 2021, o CDC tem monitorado e avaliado casos raros de miocardite e/ou pericardite em adolescentes e adultos jovens após a vacinação.
- Estes eventos adversos ocorreram numa maior proporção em meninos maiores de 16 anos e adultos jovens com menos de 30 anos, mais frequentemente após a segunda dose, e precocemente dentro dos 4 primeiros dias após a vacina. A maioria dos pacientes responderam bem a terapêutica instituída, com mínima intervenção e rápida recuperação. Não há relatos de letalidade até o momento. Por se tratar de um reação rara e de pouca gravidade e considerando a situação epidemiológica atual com a variante delta, que é mais transmissível, o CDC manteve a vacinação já que os benefícios superam os riscos de eventos adversos relacionados a essas vacinas.
- Como contraponto, um estudo da Circulation avaliou o potencial risco de miocardite pós vacinação em meninas e meninos de 12-17 anos versus adoecer por COVID-19 (internações, admissões em UTI e morte) e verificou-se que para cada um milhão de 2a dose da vacina aproximadamente 10 meninas e 70 meninos teriam um risco potencial de apresentar miocardite versus a potencial prevenção de doença em 8500 meninas e 8500 meninos.
- A SBP recomenda a vacina da Pfizer para todos os adolescentes maiores de 12 anos tendo como base os estudos clínicos desenvolvidos com esta vacina neste grupo etário, o licenciamento pela Anvisa e a experiencia de uso em outros países.
- A vacinação em adolescentes não tem somente um papel importante na prevenção da doença, mas também de proteção da comunidade, prevenindo assim surtos em escolas, encontros de jovens que tanto foram limitados na pandemia e que são fundamentais para a saude mental dos mesmos.
- Com a vacinação cobrindo cada vez mais a população adulta, é natural que as crianças começam a ser mais acometidas por não estarem vacinadas. Principalmente com uma variante mais transmissível como a Delta. Isso vem ocorrendo em diversos países que estão mais adiantados na vacinação do que nós. Por isso, até a vacinação chegar nas crianças, as medidas básicas de proteção individual com máscaras e álcool gel e o distanciamento social ainda é imperativo!
- É importante também saber que apesar de, até o momento, a vacina ter se mostrado segura pra uso em adolescentes, a vigilância e a notificação de efeitos adversos à vacina é importantíssimo para a segurança nesta população.
- A estratégia atual de vacinação deve obedecer a critérios de prioridade, cobrindo principalmente nesta fase inicial os adolescentes maiores de 12 anos com deficiências permanentes, comorbidades, gestantes e puérperas, jovens privados de liberdades e finalmente os sem comorbidades.